Fui uma pessoa educada dentro de algumas regras alternativas em vários assuntos e dentre eles o da saúde. Chamo de padrão alternativo o que a nossa sociedade considera como fora dos padrões estipulados.
Tratar da saúde de forma alternativa, para a sociedade, é escolher uma forma de se tratar respeitando mais o seu corpo, ou seja, não o infestando de química desnecessária. Então a medicina alternativa deveria ser chamada de tradicional e a medicina cheia de química a alternativa, para ser usada justamente em casos extremos.
Mas como é o “mercado” que comanda tudo, existem médicos que cuidam da saúde e médicos que cuidam de doença…
No meu caso, sempre fui adepta da medicina homeopática. Minha avó, Déborah Jassè, se tratava com homeopatia e comia comida macrobiótica.
Eu adorava, por incrível que possa parecer, os biscoitos macrobióticos que ela me dava. Eram iguaiszinhos aos biscoitos que dou para os meus cães, sendo o dos cachorros mãos macios. Deve ser por isso mesmo que meu maxilar e meus dentes são tão fortes, porque para ser capaz de mastigar aqueles biscoitos eu desenvolvi uma técnica para não quebrar nenhum dos dois, nem o maxilar e nem os dentes.
Uma criança dificilmente gosta de biscoitos que não sejam doces. Aí entra a prova maior de que, na verdade, somos seres que se habituam ao que nos é apresentado, daí o enorme perigo de apresentar todos esses alimentos fabricados em laboratórios às crianças – vide a infância alérgica e obesa que temos hoje em dia no mundo.
Eu não me lembro, na minha infância, de ter conhecido alguma criança obesa.
Alias, nós não tínhamos o hábito de ficar em frente a uma televisão comendo nuggets com refrigerante, por exemplo. Pra falar a verdade, não tínhamos nem sequer o hábito de ficar na frente da TV. A gente ficava mesmo era na rua andando de bicicleta, arrancando unhas nos carrinhos de rolimã, brincando de pique bandeira, pique esconde, queimado, jogando beisebol de palitos, como conseguiríamos juntar gordura nos nossos corpinhos. Eu era uma magricela, mas não sem forma, meu apelido era tanajura.
TV na época era sinônimo de doença ou tempo ruim, ou seja, só quando tínhamos algum problema que nos impossibilitava de brincar na rua: chuva torrencial (tinha que ser torrencial e fora do verão) ou doenças como catapora, sarampo e essas coisas é que não podíamos sair de casa. Olha, era um castigo mesmo.
Me lembro também que meus pais freqüentavam regularmente umas aulas de yoga (estou falando dos anos 60), dadas por uma alemã perto da minha casa. Eu ouvia minha mãe comentando sobre os enormes benefícios que a yoga era capaz de produzir aos adeptos. Não entendo porque não me levavam a essas aulas. Teria economizado um bocado de tempo de aprendizado nas minhas atuais saudações ao sol.
Meu pai sofria de uma bronquite asmática que era uma barra pesada. Quando ele chegava em casa era obrigado a tirar a roupa no hall de entrada para que não trouxesse para dentro de casa a poeira da rua. Nos dias de limpeza pesada, quando todos os móveis eram arrastados (psica como minha mãe é com limpeza, essas faxinas eram bem constantes), ele tinha que se manter afastado de casa até que terminasse a revolução de asseio.
Foi levado para ser tratado com umas vacinas com o mesmo método da homeopatia, tomar do próprio veneno.
Hoje em dia meu pai tem apenas uma corisa proveniente de uma rinite, porque ele largou o tratamento quando não mais desmaiava das crises asmáticas.
Claro que herdei essa asma.
Fui fumante durante 32 anos e isso só piorou a condição do meu pulmão. Me livrei do cigarro, mas a asma estava lá, denunciando os maus tratos ao pulmão por tanto tempo, isso porque abandonei o meu tratamento homeopático o que fez com que ela tomasse ares de dona de mim.
Tive um problema sério de saúde e passei por uma cirurgia bem enjoada e depois um tratamento. Tudo muito químico e aí a asma sentiu que tinha terreno fértil para se apropriar mesmo de mim. Tipo prato cheio. Olha, era uma crise atrás da outra e eu lá tomando remédio sem parar. Remédios por via oral, vias aéreas, bombinhas… Já não conseguia ficar duas semanas sem ter uma crise.
Até que, sabiamente, resolvi voltar para a homeopatia e mergulhei novamente nos pozinhos. Claro que o início é complicado, pois há que fazer uma faxina nos moldes da que a minha mãe costuma fazer. E como toda boa faxina, você expurga o que há de mais nocivo ao ambiente. O ambiente é meu corpo e o que saiu de lá foi horrível. Minha pele estourou toda, fiquei um monstro de irritada, enfim uma chateação que poucos costumam agüentar quando embarcam num tratamento como esse.
Mas posso garantir que vale super a pena. Os resultados são incríveis e permanentes.
Isso tudo foi para dizer que hoje, meu médico homeopata me perguntou na consulta o que me causava insegurança, onde aparecia meu medo?
E foi difícil responder. Sou muito destemida. Fui educada por pessoas totalmente destemidas. Não é brincadeira, minha mãe é capaz de pegar cobra venenosa com a mão, juro que é sem exageros. Também sou muito segura e confiante.
Quando saí de seu consultório entrei num avião, onde estou exatamente agora, escrevendo esse texto.
Vale a pena dizer que ando de tudo que voa e sou uma apaixonada por motores estejam onde estiverem e motores, no mar, na terra ou os que voam, que são os prediletos. Pode ser jato, supersônico, turbo hélice, bimotor, monomotor, ultraleve, helicóptero, qualquer coisa que voa, pode me colocar que vou amarradona.
E hoje, confesso que pela primeira vez na minha vida senti medo na hora em que o avião começou a taxiar.
Como puderam fazer isso comigo???
Isso é abominável.
Então me dei conta que esqueci de dizer na consulta que tenho medo de sair na rua a qualquer hora, escuro ou claro; medo de andar, um quarteirão que seja, em Ipanema ou no Leblon que fui criada e onde conheço cada esquina, sem ficar olhando paranoica para os lados. Medo de comer salada em restaurante; medo de andar de carro que não seja blindado; medo de ir ao banco tirar dinheiro; medo de tomar banho de mar e ser contaminada por coliformes fecais. Corro para casa depois de algum compromisso e tenho medo de abrir o portão da minha casa, medo de ser seguida, medo de falar com as pessoas na rua, medo de blitz falsa, medo de ser perseguida por causa das escolhas que faço, medo de não compreenderem que não somos feitos para viver em padrões escolhidos sem nos consultar, medo do retrocesso cultural e social que estamos vivendo, medo da censura, medo da falta de liberdade, medo da ignorância cada vez mais presente, medo de como as pessoas perderam o critério na busca desenfreada pelo poder e pela grana, medo da inversão de valores, medo da desonestidade, da falta de decência, de escrúpulo, de decoro, medo da falta de caráter. Tenho medo de tanta mentira que estão me contando…
Estou morrendo de medo de tudo.
Milton, será que a homeopatia tem remédio para esses medos?
De algum lugar, sobrevoando o temeroso céu do Brasil, em 31 de agosto de 2007.